Os séculos mais aflitivos da História foram, certamente, quando ruiu o Império Romano do Ocidente e a Europa viu-se invadida pelas primeiras hordas bárbaras.
Os francos eram de um barbarismo o mais rude que se possa conceber. Mas com o passar do tempo foram sendo civilizados, embora precariamente.
Nos séculos VII e VIII as hordas representavam apenas pouco menos que a barbárie.
Fora este, tão somente, e após tremenda luta, o modestíssimo fruto conseguido pela Igreja Católica.
Alguns ela arrancara ao arianismo, convertera outros, e ia conseguindo um lento processo de mitigação e dulcificação dos costumes.
Sobre esta imensa obra, ainda em começo, sopraram então, de modo verdadeiramente trágico, os tufões da adversidade.
As torneiras do mundo não cristão se abrem, e catadupas de pagãos invadem a Europa.
Da Rússia e da Prússia, regiões ainda desconhecidas, desceram bárbaros, ainda mais primitivos que os da primeira invasão, assolando, saqueando, reproduzindo os horrores antes perpetrados no Império Romano do Ocidente.
Do norte, pelo mar, vieram os normandos, de igual rudeza.
Em determinado momento, tomados de um furor navegatório, famílias, tribos, nações, o reino inteiro meteu-se em barcos e pôs-se a viajar.
Iam em cascas de nozes, beliscando o litoral, saqueando, comendo, arrasando.
Alguns de seus chefes intitulavam-se “reis do mar” ou vikings.
Nesta sanha chegaram até Constantinopla e invadiram Bizâncio, sempre assolando tudo, fazendo por vezes incursões profundas e deixando alguns pelas terras onde passavam, que continuavam a obra de destruição.
De outro lado, vindos da Espanha e invadindo até o coração da França, surgiram os sarracenos.
Atravessaram o Mediterrâneo, atacando alguns o sul da França e outros a Itália.
Todas as forças infernais desencadeadas abateram-se sobre a Cristandade ocidental. O desastre foi imenso.
Uma civilização que mal começa a se construir, nascida de um milagre – a conversão dos arianos e dos francos fora simplesmente milagrosa – e no momento em que inicia sua consolidação, sopram ventos tais que a tudo desconjuntam.
O fato é histórico, e Funck-Brentano a ele se reporta, sem contudo poder ver, naturalista que é, o que se passou além da ordem da natureza.
É um dos mais belos episódios da história da Igreja.
Uma civilização que não tivesse os seus recursos sobrenaturais teria sucumbido. Teríamos visto o seu desabamento e o fim da obra.
É fora de dúvida, contudo, que foi este desastre, em grande parte, a causa do nascimento do mais extraordinário regime político e social havido na história do mundo: o feudalismo.
Fonte: https://cidademedieval.blogspot.com.br/2018/05/a-familia-na-origem-e-na-alma-do-estado.html