Pensar no zero como representando o nada está errado. O fato é que o zero está na base de dois, ou três, importantes avanços da matemática. A história remonta um tempo antes de 1600 a.C., no berço da civilização: a Mesopotâmia. Nessa época, os babilônios tinham desenvolvido um sistema posicional para escreverem números, baseado no agrupamento de 60, de onde heranças desse sistema é a marcação do tempo em minutos e segundos. Era chamada escrita cuneiforme, pois os símbolos usados tinham a forma de cunha, onde os dois símbolos básicos eram:
Assim, os símbolos eram repetidos e agrupados para representarem qualquer número de contagem de 1 a 59. Por exemplo, para representar o número 72, faziam:
com um pequeno espaço separando a posição do 60′s da posição dos 1′s. Fazer um estudo sobre a numeração babilônia não é o intuito deste artigo, portanto, para mais detalhes sugiro procurar outra fonte de pesquisa.
Mas havia um problema com esse sistema. O número 3.612 era escrito:
que equivale a dizer: 3.600=602 e 12 uns, com um pequeno espaço extra para mostrar que o lugar dos 60′s estava vazio. Como essas marcas eram feitas rapidamente apertando um instrumento em forma de cunha em tábuas de barro macio, o espaçamento não era sempre consistente. Saber o valor real muitas vezes dependia entender o contexto do que se estava sendo descrito. Em algum momento entre 700 e 300 a.C., os babilônios começaram a usar seu símbolo para indicar fim de sentença (usaremos um ponto) para mostrar que um lugar estava sendo saltado, de modo que 72 e 3.612 se tornaram respectivamente:
Assim, o zero começou sua vida como “ocupante de lugar”, um símbolo para indicar um espaço vazio, ou que algo foi saltado.
O crédito para o desenvolvimento do sistema de valor de posição decimal que usamos hoje pertence aos hindus, em algum momento antes de 600 d.C.. Eles usavam um pequeno círculo como símbolo de ocupante de lugar. Os árabes aprenderam esse sistema no século IX e sua influência gradualmente se espalhou pela Europa nos dois ou três séculos seguintes. Os símbolos para cada dígito mudaram um pouco, mas os princípios permaneceram os mesmo (os árabes usaram o símbolo círculo para representar quantidade, sunya, tornou-se no árabe sifr, depois no latim zephirum (junto com a palavra ligeiramente latinizada cifra), e essas palavras, por sua vez, evoluíram para as palavras zero e cifra em português, Hoje em dia, o zero, usualmente como um círculo ou um oval, ainda indica que alguma potência de dez não está sendo usada.
No século IX d.C., os hindus tinham dado um salto conceitual que é um dos mais importantes eventos matemáticos de todos os tempos. Estavam começando a reconhecer o sunya (a ausência de quantidade) como uma quantidade de direito próprio. Tinham começado a trazer o zero como um número.
O matemático Mahāvīra (c.850) escreveu que um número multiplicado por zero resulta em zero, e que o zero subtraído de qualquer número não altera o número. Também afirmava que um número dividido por zero fica inalterado. Isso mostra que o conceito de operações inversas ainda não estava era dominado. Bhāskara (c.1100) afirmava que um número dividido por zero resulta uma quantidade infinita.
O mais importante destas ocorrências não é qual dos matemáticos da Índia teve as respostas certas quando calculando com o zero, mas o fato de eles colocarem tais questões em primeiro lugar. Para calcular com o zero é preciso primeiro reconhecê-lo como “alguma coisa”, uma abstração como qualquer outro número, ou seja, é preciso passar a contar uma cabra, ou duas vacas, ou três carneiros, ou pensar em 1,2,3 por eles mesmos, como coisas que podem ser manipuladas sem pensar me quais espécies de objetos estão sendo contados. Temos que pensar em 1,2,3,⋯ como ideias que existem, mesmo que não estejam contando nada. Então, e só então, faz sentido tratar o zero com um número. Os gregos antigos nunca deram esse passo extra em abstração matemática; isso estava fundamentalmente em oposição a sua ideia de que um número era uma propriedade quantitativa de coisas.
O reconhecimento pelos hindus do zero como um número foi uma chave para destrancar a porta da álgebra. O zero, como símbolo e conceito, encontrou seu caminho para o Ocidente, principalmente pelos escritos do estudioso árabe do século IX, Muhammad Ibn Al-Kowārizmī. Ele escreveu dois livros, um de aritmética e outro sobre resoluções de equações, que foram traduzidos para o latim no século XII e circularam pela Europa.
Para Al-Kowārizmī, o zero ainda não era pensado como um número, mas apenas um ocupante de lugar, descrevendo um sistema de numeração usando nove símbolos significando de 1 a 9. Em uma das traduções latinas, o papel do zero é descrito assim:
Mas quando o dez foi posto no lugar de um, e foi feito na segunda posição, e sua forma era de um, eles precisavam de uma forma para o dez devido ao fato de que era semelhante ao um, podendo assim, saber por meio dela, saber que era dez. Assim, puseram um espaço em frente a ele e puseram um pequeno círculo como a letra o, para que dessa maneira eles pudessem saber que o lugar das unidades estava vazio e que nenhum número estava ali, exceto o pequeno círculo…
As traduções latinas frequentemente começavam com as palavras Dixit Algorizmi, significando “Al-Kowārizmī disse”. Muitos europeus aprenderam o sistema posicional decimal e o papel essencial do zero por meio dessas traduções. A popularidade desse livro como texto de aritmética gradualmente fez com que seu título fosse identificado com seus métodos, dando-nos a palavra “algoritmo”.
Conforme o novo sistema se difundia e as pessoas aprendiam a calcular com os novos números, tornou-se necessário explicar como somar e multiplicar quando um dos dígitos era zero. Isso ajudou a fazê-lo parecer mais semelhante a um número. No entanto, a ideia dos hindus de que se deveria tratar o zero como um número de direito próprio levou muito tempo para se estabelecer na Europa. Mesmo alguns dos matemáticos mais proeminentes dos séculos XVI e XVII não queriam aceitar o zero como raiz (solução) de equações.
Contudo, dois desses matemáticos usaram o zero de um modo que transformou a teoria das equações. No começo do século XVII, Thomas Harriot (1560–1621), que era também um geógrafo e o primeiro medidor de terras da colônia Virgínia, propôs uma técnica simples e poderosa para resolver equações algébricas:
Passe todos os termos da equação para um lado do sinal de igualdade, de modo que a equação torne a forma:
[polinômio]=0
Esse procedimento, que Tobias Dantzig em seu livro Number: The Language ofScience de 1967 chama de Princípio de Harriot, foi popularizado por Descartes em seu livro sobre geometria analítica e às vezes atribuído a ele. É uma parte tão comum da álgebra elementar hoje que o tomamos como certo, mas que realmente foi um passo revolucionário à frente de seu tempo.
Vejamos um exemplo: Para encontrar um número x para o qual x2+2=3x seja verdadeiro (uma raiz da equação), podemos reescrever como:
x2−3x+2=0
O lado esquerdo pode ser fatorado como (x–1)(x–2). Agora, para que o produto de dois números seja igual a zero, é preciso que ao menos um deles seja zero (esta é uma outra propriedade especial do zero que o torna único entre os números). Portanto, as raízes podem ser encontradas resolvendo-se em duas equações muito simples:
e
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Esta Coletânea reúne alguns retalhos e recortes da rica história do Grande Oriente do Brasil, primeira Potência Maçônica a se instalar em território brasileiro, em 17 de junho de 1822, em comemoração aos seus 195 anos de existência. Acesso o site oficial: www.gob195anosdehistoria.com.br
195 ANOS DE FUNDAÇÃO DO
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