Existe um registro na bíblia judaico-cristã, onde o deus de Moisés se materializou aos seus olhos como um fogo sobre um arbusto e disse: eu sou aquele que é, e ainda, eu sou me enviou até vós. Isto para uma mente não treinada constitui um absurdo, pois algo que afirma que apenas é tem sentido vago, impreciso e não pode ser associado com uma entidade de qualquer tipo. Em seu estado natural, sem a devida instrução, o homem tem pouca, ou nenhuma capacidade de lidar com o abstrato. Mas por condicionamento mental ele tem necessidade em sempre converter as informações que o rodeiam em símbolos. Tem tendência natural de nomear tudo o que encontra ao seu redor, para tudo há necessidade de criar um símbolo. E o maçom sabe muito bem o quanto os símbolos são importantes para o processo cognitivo. Pelo dicionário, deus não é nome próprio, é substantivo masculino comum, por isto é escrito em letras minúsculas; só utilizando maiúscula quando for nome próprio. Daí o deus do cristão pode ser representado por: deus, criador, o todo poderoso, o pai, o pai eterno, o onipotente, o altíssimo, e outros; até Jesus Cristo é confundido como se fosse o deus dos israelitas. Para o judeu e seus peritos religiosos, o seu deus tem um nome que pode ser vertido como Javé, Iavé, Elohím, Adhonay, Jah, e outros. Em língua portuguesa é comum encontrar-se o nome próprio Jeová.
Aviltado pelo antropomorfismo generalizado e diante da confusão da existência de miríades de deuses e santos, esbarra-se com as mais diversas linhas de pensamento que defendem um número enorme de variações. Quando perguntado por Moisés, aquele deus se apresentou como aquele que apenas é. Isto tem semelhança com o conceito de Grande Arquiteto do Universo, o que não causa discussões vazias e tolas. Mas isto para um simples operário, lavrador, criador de amimais é subjetivo e abstrato. O próprio Moisés solicitou que aquele deus declinasse o nome quando em seu primeiro encontro. Inclusive ele, dotado de grande cultura, com todo o treinamento iniciático egípcio, com todo o conhecimento dos segredos e da cultura metafísica evoluída dos sacerdotes egípcios, privilégio que a condição de adido da família real proporcionou, teve como primeira reação obter um símbolo para algo que se identificou apenas como aquilo que simplesmente é. Isto facilita a dedução do porque o povo judeu dar-lhe um nome. Um deus sem nome já era incomodo por razões racionais, intuitivas e naturais, mas era agravado sobremaneira porque os vizinhos tinham deuses com nomes, e como é comum entre as religiões, aqueles certamente desdenhavam do deus de Moisés. Mesmo com a promessa daquele deus de que um descendente obteria um nome para ele, diante da realidade vivida nos desertos, os orgulhosos judeus exigiram para eles que o seu deus tivesse um nome também. Daí inventou-se o tetragrama hebraico iod, he, vau, he; escrito da direita para a esquerda, contrário ao padrão de escrita latinizado da esquerda para a direita, e que pode ser escrito IHVH, ou IHWH, ou ainda JHVH; existem diversas maneiras de verter o tetragrama do nome inefável em línguas latinas, mas dão apenas uma noção muito pobre de tradução escrita do nome do deus de Israel.
As consoantes no nome original que o deus de Israel recebeu no deserto pelos seus adoradores chegaram até nossos dias. O problema é a inexistência de vogais no hebraico original. E sabe-se que as consoantes não produzem sons, antes, elas alteram o som produzido pelas vogais. Apenas as vogais produzem fonemas em resultado de símbolos gráficos. Fonema é som, letra é o sinal gráfico que representa o som. As incógnitas são quais vogais a combinar com as quatro consoantes. É um problema insolúvel, pois não existiam gravadores de som naquela época! As vogais eram introduzidas e usadas ao gosto de cada um. É de conhecimento geral que qualquer processo linguístico é dinâmico no tempo; basta observar as gritantes diferenças existentes entre o português falado no Brasil e em Portugal; mesmo com as rígidas regras ortográficas estabelecidas em comum. Pela ausência de pontuações vocálicas, entre os próprios judeus da época de Moisés já foram se estabelecendo mudanças quanto à correta fonação do tetragrama. O hebraico só veio a utilizar-se de pontos vocálicos na segunda metade do primeiro milênio da era cristã, faz um pouco mais de um milênio. E estes pontos vocálicos introduzidos não fornecem a chave para se pronunciar o nome inefável do deus israelita exatamente como faziam Moisés e seus contemporâneos.
Acrescente-se a isto que o próprio povo judaico, por excesso de zelo, estabeleceu pecaminoso pronunciar o nome do deus representado pelo tetragrama. Inexistem provas cabais para determinar quando exatamente os judeus passaram a evitar a pronúncia do nome do seu deus. Sabe-se que o excesso de zelo dos sacerdotes foi endurecendo cada vez mais as rígidas normas religiosas judaicas a tal ponto que passaram a considerar que o nome de deus fosse sagrado demais para ser pronunciado por ordinários e imperfeitos mortais. Todavia, ao ler as escrituras hebraicas é fácil observar que os mais antigos escritores não tinham o menor receio em se utilizarem do tetragrama nos escritos que traduziam suas experiências metafísicas. Naquela época o tetragrama era usado tanto em escritos religiosos como em correspondência mundana. Existem estudos que pretendem definir que o povo judaico passou a evitar proferir o nome inefável quando do êxodo para a Babilônia, no ano 607 antes de Cristo, o que é falso e baseado numa tendência das escrituras hebraicas apresentarem o nome cada vez menos. A data mais provável da abstenção do uso do nome é cerca do ano 270 antes de Cristo, mas também não passa de especulação. Resumindo: o nome passou a não ser usado por simples fanatismo.
Na introdução ao Pentateuco da Bíblia de Jerusalém, os autores afirmam que seria um absurdo exigir das tradições de um povo, o que lhe propiciava sentimento de unidade e a base de sua fé, a precisão exigida por um historiador moderno. Em contrapartida, seria errado também negar-lhes a verdade em decorrência do rigor técnico da historicidade. Todas as alegorias e fábulas da origem do universo e do homem do Pentateuco são partes do que convinha à mentalidade de um povo inculto que se satisfazia com isto para tentar explicar a origem do universo e de todas as coisas e criaturas. A Maçonaria usa de semelhante processo em suas instruções. Mas aquele povo carregava em seus genes a necessidade de nomear tudo o que o rodeava daí exigirem um nome para o seu deus. Com seus recursos de escrita registraram o pentagrama que representava o nome de seu deus, e que só eles, os inventores, tiveram a capacidade de produzir o som correto da pronúncia dos fonemas representados.
A Maçonaria usa o nome Jeová ao referir-se ao tetragrama e nenhuma argumentação justifica o abandono do uso deste nome próprio, principalmente em resultado de não se saber o seu som original, o que constitui uma insignificância que foi transmitida pelo próprio Moisés quando em seu primeiro contato com o deus que apenas é. Não se deve deixar de dar um nome, principalmente se este for o deus que satisfaz às necessidades metafísicas individuais. Nomear as coisas, e principalmente aquilo que se considera o mais sagrado, a razão de existir, é uma necessidade física e emocional de cada um a sua maneira. O próprio uso freqüente que fazem os mais diversos escritores dos livros da Bíblia o justifica, haja vista que o tetragrama aparece quase sete mil vezes apenas nas escrituras hebraicas, ou velho testamento. Ademais, Jeová é um nome próprio, designativo de um ser, independente do que seja ou de como é. É um nome pessoal, para uso do cidadão que deseja um relacionamento pessoal com esta divindade. Reconhecendo a grave falha de retirar o nome do incriado da bíblia e do uso coloquial, apareceram traduções novas como A Bíblia de Jerusalém, que introduziu o nome Iahweh. Já é um avanço, pois tanto faz o nome que se dê: Iahweh ou Jeová são nomes próprios e em nada diminuem o valor que seus adoradores lhe dedicam.
A maior liberdade é a preconizada pela Maçonaria por influência dos Iluministas. Na seara da discussão de detalhes como dar um nome para aquele que simplesmente é, nada se adiciona na construção que dignifique o homem e sua sã racionalidade. O século das luzes, injustamente acusado de advento do ateísmo, é na verdade o início da libertação dos grilhões da pequenez humana que discute detalhes da divindade que em nada melhoram as condições de vida moral do cidadão, antes, foi e é causa de guerras. O que de fato interessa é obter o laboratório próprio para efetuar saltos no conhecimento para propiciar eras de paz e tranquilidade para a humanidade, no encontro ao desejo do desenho do grande Geômetra. O despotismo combatido pela Maçonaria não admite em seu meio que se perca tempo com prospecção da pronúncia correta de um deus, por isto estabeleceu como forma de atender às necessidades metafísicas de cada adepto o conceito Grande Arquiteto do Universo, que representa Jeová ou qualquer outro deus que o iniciado maçom tenha em resultado de suas necessidades espirituais.
Autor: Charles Evaldo Boller
Referências Bibliográficas
BENOÎT, Pierre; VAUX, Roland de, A Bíblia de Jerusalém, título original: La Sainte Bible, tradução: Samuel Martins Barbosa, primeira edição, Edições Paulinas, 1663 páginas, São Paulo, 1973. Autores: P. Benoît, escritor francês. Pierre Benoît. Nasceu em 16 de julho de 1886, em Albi. Faleceu em 3 de março de 1962, em Ciboure, com 75 anos de idade. Roland de Vaux, escritor e padre francês. R. De Vaux. Nasceu em 17 de dezembro de 1903. Faleceu em 1971, com 67 anos de idade. Padre dominicano. Diretor da Ecole Biblique. Tradutor: Samuel Martins Barbosa, tradutor brasileiro;
CEGALLA, Domingos Paschoal, Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, ISBN 85-04-00789-8, 31ª edição, Companhia Editora Nacional, 556 páginas, São Paulo, 1989. Sinopse: Gramática da língua portuguesa mais voltada para o uso no Brasil. Autor: Domingos Paschoal Cegalla, autor e professor brasileiro;
CINTRA, Celso Cunha Lindley, Nova Gramática do Português Contemporâneo, segunda edição, Editora Nova Fronteira S/A, 724 páginas, Rio de Janeiro, 1985. Sinopse: Gramática da língua portuguesa com os contrastes entre a língua falada em Portugal e no Brasil. Autor: Celso Cunha Lindley Cintra, autor e professor brasileiro.
Fonte: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/