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HomeTemplo de Estudos MaçônicosNOTAS SOBRE A HISTÓRIA DA FRANCO-MAÇONARIA

NOTAS SOBRE A HISTÓRIA DA FRANCO-MAÇONARIA

Um maçonólogo francês afirmou que foram escritas umas 60.000 obras sobre a FRANCO-MAÇONARIA, mais ou menos (PAUL NAUDON, 1963).
E que, mesmo assim, continua ela mal conhecida, sobretudo nos países latinos.
As opiniões de muitos sobre a Ordem são preconcebidas, e por ouvir dizer.
CHARLES BERNARDIN, em 1909, consultou 206 obras, e encontrou 39 opiniões diferentes sobre as origens da FRANCO-MAÇONARIA.
Quinze autores, aliando ingenuidade e irrealidade, mencionam a existência de uma loja maçônica no Paraíso terrestre.
Um autor aprofunda ainda mais a fantasiosidade de seu estudo: a FRANCO-MAÇONARIA já existia antes da criação do mundo.
ANTONIO COEN e MICHEL DUMESNIL concluíram, em 1934, que se ignora a gênese da FRANCO-MAÇONARIA, e que todos os historiadores continuam, nesse ponto, no domínio das suposições (“Seitas e Sociedades Secretas”, Ed. Fase Ltda., p. 201).
A História da FRANCO-MAÇONARIA suscita dúvidas, mergulha na insegurança, e tem a mesma dificuldade no reconstituir fatos que os historiadores de outras instituições encontram.
Entretanto, a nebulosidade dos tempos não impossibilita que, com grandes dificuldades, sejam observadas as linhas mestras da caminhada histórica dos maçons.
Sabe-se que os primeiros maçons surgiram no palco da História humildemente. E envolvidos com a Religião Católica.
ALBERT GALLATIN MACKEY (1807-1881), na célebre “Enciclopédia da Franco-Maçonaria”, salienta que desde a época de CARLOS MAGNO, no século VIII, até meados do século XII, todos os conhecimentos e práticas de Arquitetura, Pintura e Escultura se limitavam exclusivamente aos monges, e por isso os bispos dirigiam pessoalmente a edificação das catedrais e igrejas de suas dioceses.
Os princípios e a prática da Arte de Construir eram segredos guardados escrupulosamente no interior dos muros dos claustros, e inteiramente desconhecidos pelos leigos.
Entre estes últimos, que se empregavam nos monastérios como ajudantes e trabalhadores, muitos eram pessoas de inteligência superior.
A associação íntima e constante de tais leigos com os monges no desempenho das mesmas tarefas, com idêntico desígnio, teve como resultado, com o transcurso do tempo, a divulgação, entre eles, do conhecimento dos segredos da arte e dos princípios esotéricos da Arquitetura.
O conhecimento das artes e das ciências disseminou-se, portanto, gradualmente em todo o mundo, por meio destes arquitetos monásticos.
E os leigos arquitetos, então, retirando-se das fraternidades eclesiásticas, organizaram irmandades entre eles.
Aí está o início das fraternidades Maçônicas na Alemanha.
O mesmo ocorreu em outros países.

E. CARTIER, autor “clerical” de um estudo com o título “Jesus Cristo na Arte” (1864), afasta os monges de qualquer postura exclusivista com relação a monopólio de segredos.
Mas reconhece que a organização teórica e prática da Arquitetura residia inteira nas associações de artífices, que remontam às corporações da antigüidade.
E que nestas associações se conservavam em depósito as doutrinas e a tradição dos processos por elas aperfeiçoadas e transmitidas de geração em geração.
Eram elas constituídas hierárquica e legalmente, possuíam privilégios, sinais de identidade, meios para aquilatar o merecimento do operário e lutar com a concorrência da mediocridade, mutuamente se auxiliavam, estabeleciam relações entre os centros grandes, divulgavam os melhores métodos, ativavam e generalizavam tudo o que era progresso na arte.
É forçoso concluir que os artífices medievais representaram apenas um momento da História do ofício de construtor, ofício este que se situa entre os primeiros do mundo, no dizer de JEAN PALOU.
Detinham eles conhecimentos herdados que aperfeiçoaram.
Se estes conhecimentos, nos seus momentos históricos antecedentes, foram privilégio exclusivo de alguns espíritos superiores, pode-se concluir, como conseqüência, que a origem da Ordem mergulha profundamente nos séculos anteriores.
Mas hipóteses, para merecerem credibilidade, devem ser demonstradas.
O Egito e suas pirâmides, acrescido de muita imaginação, é sempre lembrado.
A origem operária da FRANCO-MAÇONARIA não agradava a um maçom que se tornou célebre, homem de tendências aristocráticas.
Ninguém desempenhou, todavia, um papel mais importante que ele na História da FRANCO-MAÇONARIA do século XVIII.
Refiro-me ao célebre Cavaleiro RAMSAY, nascido em Ayr, na Escócia, em 9 de junho de 1668.
Ao visitar FENELON, arcebispo de Cambray, de cujas tendências místicas tinha ouvido falar, foi seu hóspede, e acabou convertido a fé católica.
Repudiava a relação da FRANCO-MAÇONARIA com a arte ativa, e buscou um modo de encontrar seu lugar de origem na Palestina, entre aqueles reis e cavaleiros que tinham ido combater como Cruzados pela conquista de Jerusalém.

Seu discurso de 1737 ou 1740, pronunciado ante a Grande Loja da França, embora divorciado da História, ainda hoje repercute nos graus superiores adotados pelos diferentes Ritos maçônicos.
MICHEL DE RAMSAY encontrou, imaginativamente, uma origem cavalheiresca e nobre para a FRANCO-MAÇONARIA, que para ele não era uma confraria fundada no Sistema da Arquitetura, mas unicamente nas proezas militares e no entusiasmo religioso da Ordem Cavalheiresca.
Não ofereceu, entretanto, provas históricas ou documentadas para apoiar sua teoria.
Suas afirmativas foram facilmente aceitas pelos ricos, pela gente de classe e pelos nobres.
RAMSAY foi fiel servidor da família destronada da Inglaterra, dos STUARTS, tendo sido preceptor de dois de seus príncipes.
Mencionou apenas os Cruzados em sua teoria, e de sua fábula surge outra, a chamada “lenda templária” (R. LE FORESTIER).
Os Templários, “pobres cavaleiros de Cristo”, teriam sido os instituidores da Ordem.
Com o Convento de Wilhelmsbad, em 1782, reunindo o conjunto dos notáveis de toda a FRANCO-MAÇONARIA ocidental, sob a presidência do duque FERDINAND DE BRUNSWICK, reconheceu-se que o mito templário poderia trazer suspeitas políticas e desconfianças dos governos para com os maçons (PETER PARTNER).
E concluiu-se também que a filiação templária somente tinha um significado moral, místico-cristão (ANTOINE FAIVRE).
É uma ironia da História que o monarquista e católico RAMSAY, ao atribuir fantasiosamente a origem da FRANCO-MAÇONARIA aos cristianíssimos Cruzados, que serviram na Palestina juntamente com os cristianíssimos Templários, tenha motivado o surgimento de uma terrível e mentirosa estória.
A Grande Revolução Francesa, gigantesco acontecimento anti-monárquico, anti-católico e irreligioso, considerada por uma literatura sem credibilidade como fruto de uma conspiração templária, como tal ganhou visto de dado histórico irrefutável para espíritos desavisados.
Na sangüinolência revolucionária, nem sequer o grão-mestre FILIPE DE ORLÉANS foi poupado, pereceu decapitado.
Estamos, agora, voltando no tempo, no ano de 1717.

A instituição maçônica vivia um período de crise na Inglaterra, quando se produziu um movimento para fazer dela uma organização filantrópica, leal ao soberano reinante.
Ocasião em que se destacam dois pastores protestantes, JAMES ANDERSON e JEAN-THÉOPHILE DESAGULIERS, este de origem francesa.
Ambos foram conhecidos em sua época além do meio maçônico, inclusive mereceram serem citados por ADAM SMITH, pai da Ciência Econômica, em sua célebre obra “Inquérito sobre a natureza e as causas da Riqueza das Nações”.
Em 24 de julho de 1717, e esta data é exata, quatro lojas de Londres fundaram uma Grande Loja, encarregada de unificar os regulamentos da FRANCO-MAÇONARIA.
Nobres e burgueses foram recebidos em grande número, e pouco a pouco os simples artesãos desapareceram das assembléias, onde se encontravam, desde então, desorientados: a FRANCO-MAÇONARIA já não era uma corporação de mestres de obras, mas um corpo puramente “especulativo” (SERGE HUTIN).
A palavra especulativo, de forma geral, significa teoria, contemplação (MARIUS LEPAGE).
A reunião, então de pouca significação, das quatro lojas de Londres, na taverna do POMMIER, deu a luz a essa notável Associação que se estende hoje pelo mundo inteiro.
Em 1723 foram publicadas as “Constituições”, redigidas por JAMES ANDERSON, contendo uma história fabulosa e fantasiosa da FRANCO-MAÇONARIA e seus estatutos.
Os estatutos, abrindo a Sociedade aos que praticavam “a religião sobre a qual todos os homens estão de acordo”, instavam os maçons a cultivar “o amor fraternal que é o fundamento e a pedra mestra, assim como o cimento e a glória desta antiga Irmandade”.
A FRANCO-MAÇONARIA, por outro lado, não é, sabidamente, uma instituição religiosa, mas nunca esteve distante da Religião.
Na fase operativa foi Católica, na fase especulativa a influência dos pastores protestantes ANDERSON e DESAGULIERS foi decisiva.
Está nas “Constituições” que o primeiro dever de um franco-maçom é concernente a Deus e a Religião:
“Um Maçom está obrigado, pela sua Franquia, a obedecer à Lei moral; e se ele compreende corretamente a Arte, ele nunca será um Ateu estúpido, nem um Libertino irreligioso. Mas embora nos Tempos antigos os Maçons recebessem a determinação em todos os Países, de pertencer à Religião daquele País ou Nação, qualquer que ela fosse, contudo é agora considerado mais conveniente apenas obrigá-los àquela Religião sobre a qual todos os Homens concordam, deixando a cada um sua opinião particular; isto é, a de serem bons e leais Homens, ou Homens de Honra e Honestidade, sejam quais forem as Denominações ou Crenças que possam distinguí-los; assim a Maçonaria se torna o Centro de União e o Meio de conciliação da verdadeira Amizade entre as pessoas que poderiam de outra forma ter permanecido perpetuamente Afastadas”.
No ano de 1877, por proposta do pastor DESMONS, o Grande Oriente de França riscou de suas Constituições o artigo 1º que exigia a crença em Deus e na imortalidade da alma.
Desferiu, assim, um duro golpe em si mesmo, afastando-se da chamada “regularidade” maçônica.
Mas é também naquele país que o maçom DENIZARD – HIPPOLYTE – LÉON RIVAIL (1804-1869), conhecido como ALLAN KARDEC, fez suas revelações sobre os espíritos, que logo ganharam o mundo (ANDRÉ DUMAS).
Contribuiu, desta feita, para que milhões de maçons e não maçons espíritas reafirmassem os imutáveis ”landmarks” da FRANCO-MAÇONARIA universal, referentes a crença em Deus, na ressurreição e na vida futura (ns. 19 e 20), em todo o mundo.
Hoje, quando a globalização já é um processo irreversível, o distante discurso de RAMSAY nos dá uma antevisão do que deveria ser.
Os homens não se distinguem essencialmente pela diferença das línguas que falam, dos hábitos que possuem, pelas regiões que habitam, nem pelas dignidades de que são revestidos.
O mundo inteiro não é senão uma grande República, da qual cada nação é uma família e cada indivíduo, um filho.
Foi para reviver e expandir estas máximas essenciais, inerentes à natureza humana, que foi inicialmente estabelecida a Sociedade Maçônica, conclui o nobre Cavaleiro.
Felizmente o sonho nunca foi proibido aos homens.

E convém lembrar, antes de terminar, que Sonhos não são muito diferentes de Ações, ao contrário do que alguns imaginam, pois todas as Ações dos homens foram a princípio apenas Sonhos, e, no fim, estas mesmas Ações dissolvem-se novamente em Sonhos (THEODOR HERZL,1902).
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O historiador inglês PETER BURKE fez trabalho de arqueologia intelectual quando traçou a linha de evolução histórica dos clubes associativos.
Os clubes tradicionais, tão importantes no Ocidente, especialmente nos séculos 18 e 19, tem suas raízes fincadas na Idade Média.
Contribuíram para a Democracia, o Iluminismo e a modernização.
A vida social da cidade européia foi bastante influenciada, nos séculos 14 e 15, pelas guildas de artesãos, que originaram os modernos sindicatos, e pelas guildas religiosas ou “confrarias”.
As “confrarias” associavam voluntariamente cidadãos, principalmente homens, promoviam a solidariedade e a fraternidade entre seus membros, que comiam e bebiam juntos, participavam de funerais, de procissões na festa do santo padroeiro da associação, etc.
A Europa católica conviveu com elas por séculos.
Desapareceram na Grã-Bretanha com a Reforma, e lá renasceram eivadas de laicismo nos séculos 17 e 18.
Variavam os objetivos dos clubes londrinos, mas a instituição assumia formas semelhantes: reuniões regulares em tavernas, sócios bebendo juntos, diretorias eleitas, aprovação de regras ou da “Constituição” interna, registro de decisões em “minutas”, etc.
Inseriam associativamente os seres no treinamento de uma cultura democrática, de liberdade, de igualdade e, sobretudo, de fraternidade.
Os maçons organizaram-se em clubes locais ou “lojas”, que se espalharam pelo mundo, e decisivamente contribuíram para o Iluminismo.
A convivência clubística, entre membros de diferentes classes sociais, ajudou a criar uma mentalidade mais democrática, disseminando o modelo constitucional de associação voluntária, com regras e diretoria eleita.
Instituições a meio caminho entre o mundo privado da família e o mundo público do Estado, ajudaram a desenhar o que hoje se chama “sociedade civil”.
BURKE endossa a preocupação do cientista político americano ROBERT PUTNAM, que vê no declínio atual dos clubes ligação com o declínio da democracia, sintoma de um declínio na disposição de participar da vida pública ou da cultura democrática.
Os clubes disseminaram pelo mundo mentalidades e primários instrumentos democráticos, e tem sua origem histórica envolvida com as confrarias surgidas sob as asas da Igreja Católica.
HENRY KISSINGER deu belíssima lição de imparcialidade e apego a verdade histórica, quando ressaltou, em suas memórias, que:
“No Ocidente, a democracia não resultara de uma simples decisão, e sim de uma evolução que se estendeu por séculos. As caraterísticas únicas da evolução pluralista do Ocidente começaram com a igreja católica que, embora muito pouco democrática em sua organização interna, criou as bases para essa evolução ao insistir em seu próprio e distinto controle, e na definição da prevalência da ordem moral sobre o Estado.
A separação da autoridade entre Deus e César levou ao primeiro passo para o pluralismo político e para a limitação do poder do Estado.”
A Igreja Católica não pode ser lembrada apenas pelos seus erros passados, em especial pela tenebrosa Inquisição.
O Papa João Paulo ll ao dar o assoprão final no desmonte dos regimes da Europa Oriental, merece a gratidão da Humanidade.
Reacendeu as luzes naquele canto escuro do mundo.

 

Fonte: JB News

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