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Tivemos o privilégio de ler muita literatura maçônica e, desta forma, podemos afiançar que sobre nenhum outro símbolo foram escritos tantos contrassensos. Mil e uma coisas foram sobre ele imaginadas. E todas essas hipóteses – que vão da folha usada por Adão e Eva à última teoria matemática da Quarta Dimensão – nada mais fizeram senão escandalizar o homem inteligente e desnortear o homem comum…Por termos vistos outros afundarem no abismo dos absurdos, agiremos com maior prudência, caminhando cautelosamente, formando as nossas teorias com o maior cuidado.

Não pretendemos desrespeitar aqueles que nos antecederam neste campo de trabalho, mas, falando de modo geral, podemos dizer que a maior parte das extravagantes teorias que se formaram sobre o Avental teve por base a sua forma que, como se sabe, é de origem relativamente recente e devida a um mero incidente histórico. A forma ora em uso é quase quadrada, sugerindo assim o simbolismo do esquadro, do ângulo reto e do cubo, e de tudo o mais que daí possa surgir. O fato de ser a abeta triangular sugeriu, por outra, o simbolismo do triângulo, da 47ª Proposição de Euclides e da pirâmide.

Quanto à descida da abeta sobre o corpo do Avental, também isto forneceu motivos para raciocínios igualmente ingênuos. Valendo-se de semelhante método de interpretação, quiseram ver no Avental toda espécie de coisas: a mitologia dos Mistérios, as metafísicas da Índia, os extravagantes sonhos da Cabala e os ocultismos da Magia. Esqueceram, entrementes, que o Avental é simplesmente um símbolo maçônico, cujo verdadeiro significado deverá ser descoberto, em lugar daquele que, pela pressão exercida por nossa natural tendência para a fantasia, possamos querer fazê-lo exprimir.

Se consultarmos o Ritual, como ele merece e como sempre devemos fazer, veremos que nele o Avental é tratado como:

Uma herança do passado;

Um distintivo do Maçom; e

Um emblema da inocência e do sacrifício.

Examinaremos, detida e separadamente, cada um destes três aspectos.

O Avental é uma Herança do Passado

Durante três ou quatro mil anos, o Avental foi usado com diversos propósitos e sob várias formas. Num dos antigos mistérios, pelo menos – o de Mitra -, investia-se o candidato com um avental branco, sendo este mesmo uso adotado para os iniciados dos essênios, que o usavam durante o primeiro ano de sua iniciação. Muitas estátuas de deuses gregos e egípcios como ainda se podem ver, eram com ele ornamentadas, o que é muito significativo.

Em muitos casos as sociedades secretas chinesas usaram o Avental, sendo que os persas, em certa época, o empregaram como bandeira nacional. Também os profetas judeus usaram muitas vezes os aventais, assim como fizeram os candidatos ao batismo e como ainda o fazem os dignitários eclesiásticos.

Esse costume é igualmente encontrado entre os selvagens, como notou o Ir∴ J. C. Gibson, que escreveu:

“Por toda parte onde existe o sentimento religioso – mesmo entre as nações selvagens da Terra – foi observado o desejo dos nativos de usarem uma cinta ou um avental de qualquer espécie.”

Dito isto, não devemos inferir, contudo que o Avental tenha chegado até nós por meio dessas fontes, embora, pelo que sabemos, os construtores primitivos possam ter sido influenciados por esses antigos e universais costumes. O fato de os Maçons Operativos usarem o Avental deve-se, ao que tudo indica, tão somente ao propósito bastante prático de protegerem a sua roupa, como se torna necessário num trabalho tão rude como o seu. O Avental era, indiscutivelmente, um artigo necessário no equipamento de um trabalhador, como o foi demonstrado pelo Ir∴ W. H. Rylands, que encontrou um contrato datando do ano de 1685, e pelo qual um Mestre obrigava-se a suprir o seu Aprendiz com “suficiente, saudável e competente alimento, bebida, alojamento e Aventais”.

Sendo o Avental parte tão destacada do costume do Maçom Operativo e parte tão constante de seu equipamento, era inevitável que os Especulativos continuassem a usá-lo, embora com propósitos simbólicos. O Ir∴ J. F. Crowe, que foi um dos primeiros a realizar uma investigação científica e completa do assunto, diz que o mais conhecido primitivo representante de tais aventais é aquele que se encontra “numa gravura com o retrato de Anthony Sayer…É visível na ilustração somente a parte superior, sendo a aba levantada, presumindo-se ser o avental constituído de uma pele bastante comprida. O desenho seguinte encontra-se no frontispício do ‘Livro da Constituição’, publicado em 1723, no qual um Irmão é representado entregando na Loja um certo número de Aventais e de Luvas, parecendo o primeiro ter tamanho considerável e cordões compridos” (A.Q.C., vol. 5, p. 29).

Na caricatura de Hogarth, chamada “Noite”, desenhada em 1737, as duas figuras maçônicas assinaladas por Crowe em outro estudo (vide sua obra “Coisa que um Maçom deveria saber”), “têm aventais que chegam aos tornozelos”. Entretanto, outras ilustrações do mesmo período mostram aventais alcançando apenas o joelho, o que assinala o começo do processo de encurtamento, e do decréscimo geral no tamanho, assim como na alteração da forma, o que, finalmente, nos deu p Avental da nossa época; desde então, esse vestuário já não serve mais como meio de proteção, tendo sido encontrado um meio de adaptá-lo a uma maneira mais conveniente de vesti-lo, o que não é incompatível com o seu significado maçônico original. Como foi sugerido linhas atrás, o fato responsável pela presente forma do Avental é mero resultado de determinadas circunstâncias, o que demonstra o quanto são infundadas as interpretações baseadas na sua forma.

De acordo com os usos adotados nos EUA pelas Lojas simbólicas, o Avental precisa ser de pele de cordeiro imaculada, tendo de 14 a 16 polegadas de comprimento e de 12 a 14 polegadas de largura, com uma aba de 3 a 4 polegadas.

A Grande Loja da Inglaterra especifica que semelhante Avental destina-se ao Primeiro Grau, precisando o Avental do Segundo Grau ter na base duas rosetas azuis celeste, ao passo que o de Terceiro Grau deve ter a mais uma guarnição de fita da largura de não mais de duas polegadas, “e uma roseta adicional na abeta caída, e borlas de prata”. É permitido aos Grandes Oficiais o uso de outros ornamentos, bordados, dourados, e, em vários casos, fitas de cor carmesim. É de toda evidência que tais Aventais decorados são de origem recente. O Avental deve ser sempre vestido fora do casaco.

O Distintivo do Maçom

“A espessa pele curtida, cingida em torno dele com correias, por onde quer que o Construtor edifique, e onde, à tarde, prende a sua colher de pedreiro”, era, assim, a parte mais notável do traje do Maçom Operativo, com ele associando-se na mente do povo, pelo que, ao evoluir, tornou-se a sua insígnia; e sendo uma insígnia, qualquer marca voluntariamente adotada como resultado de um costume estabelecido, uma profissão, um emprego ou uma escola de opinião, pode por ela ser representada.

Por onde a insígnia do Maçom tornou-se uma marca? A sua história permite, por certo, a qualquer um responder: é a marca do trabalho honrado e consciencioso, do trabalho dedicado a criar, a construir, ao invés de destruir ou de demolir. Como tal, o Avental do Maçom – por si mesmo símbolo da profunda modificação na atitude da sociedade relativamente ao trabalho manual e intelectual, outrora desprezado pelos grandes da Terra, e ao qual ela se tornou propícia – transformou-se na única insígnia de uma vida honrada. Se os homens outrora se sentiam ufanos em usar uma espada, enquanto abandonavam a servos e escravos os trabalhos da vida, se outrora títulos e brasões eram procurados como emblemas de distinção, hoje, se a expressão figurada nos for permitida, os homens mostram-se ansiosos por usar um Avental. É fora de dúvida que o cavalheiro da época atual há de preferir salvar uma vida a ceifá-la. E há de preferir, mil vezes, a glória do próprio aperfeiçoamento à glória de um título ou de um nome. Na verdade, “a posição social mudou o lado da medalha, e a humanidade ao homem, principalmente se for um homem capaz de realizar; e o verdadeiro rei moderno, como sempre afirmara Carlyle, é o ‘homem que pode”.

E se tudo isto constitui a mensagem do Avental, ninguém tem mais direito de usá-lo do que o próprio Maçom, se ele for um verdadeiro membro da Ordem, visto ser ele um Cavaleiro do trabalho, se é que semelhante título existiu alguma vez. Nem todo trabalho, porém, se ocupa de objetos. Há o trabalho da mente e do espírito, muito mais árduo amiúde, e bem mais difícil do que qualquer trabalho manual. Aquele que dedicou os seus esforços a limpar os estábulos da Augias do mundo, aquele que se dedicou a varrer o lixo que cobre os caminhos da vida, aquele que se dedicou a dar forma às pedras de construção na confusa pedreira da humanidade, é digno, mais do que qualquer outro homem, de usar a insígnia do trabalho.

Um Emblema da Inocência e do Sacrifício

Ao revestir o Aprendiz com o Avental, é costume dizer-lhe que é o emblema da inocência. É duvidoso que alguma vez as Lojas operativas tivessem usado o Avental com semelhante propósito simbólico, embora isto não fosse impossível no século XVII, depois que os Especulativos começaram a ser recebidos em maior número. A evidência indica, todavia, que esse simbolismo nasceu somente depois da criação da Grande Loja de Londres. Foi a consequência direta do regulamento que dispõe que o Avental deve ser confeccionado de uma pele de cordeiro branca, e foi então que os Maçons começaram a ver na cor o emblema da inocência e, na sua contextura, uma ideia do sacrifício.

Voltou-se com isso à linha das práticas antigas pelas quais o branco “foi considerado um emblema da inocência e da pureza”. Entre os romanos, uma pessoa acusada devia, em certas ocasiões, revestir-se de roupas brancas, a fim de atestar a sua inocência, por ser o branco, conforme disse Cícero, “muito agradável aos deuses”. O candidato aos Mistérios, e entre os próprios essênios, era revestido de modo semelhante. O mesmo significado de pureza e de inocência é dado pela Bíblia, embora nela exista a promessa de que, apesar das nossas culpas serem como o escarlate, ele continuará branco assim como a neve.

Na primitiva Igreja cristã, os jovens catecúmenos (ou convertidos) vestiam-se de branco, assinalando assim a sua decisão de abandonar o mundo e a sua determinação de trilhar uma vida inocente. Mas não há necessidade de multiplicar exemplos, cada um de nós sente instintivamente que o branco é mesmo o símbolo natural de inocência.

Ocorre-nos que “inocência” procede de uma palavra lembrando “não fazer mal”, o que pode muito bem ser tomado como a sua definição maçônica, sendo evidente que nenhum adulto poderá ser considerado inocente no mesmo sentido que uma criança, isto é, ignorando o mal. A inocência do Maçom há de ser a sua brandura, a cavalheiresca determinação que o anima a não praticar ato sem moral dirigido contra quem quer que seja: homem, mulher ou criança; a sua paciente indulgência para com a imperfeição e a ignorância humanas; o seu perdão cheio de caridade para com os seus irmãos, quando estes, deliberada ou inconscientemente, lhe fazem mal; a sua dedicação em favor de uma Cavalaria espiritual que exalte os valores e as virtudes da humanidade, só através das quais um homem pode elevar-se acima do bruto, e o mundo ser levado avante em seu caminho ascendente.

É no símbolo de sua contextura – pele de cordeiro – que, além disso, encontramos no Avental o significado do sacrifício, simbolismo este que também se desenvolveu por volta do ano de 1700. Acreditou-se, geralmente, até uma época recente, que os Operativos usavam apenas aventais de couro, o que certamente aconteceu em épocas muito primitivas. Crowe, entretanto, demonstrou que os registros da mais antiga Loja apresentam a evidência de igual uso de linho:

“Na velha Loja de Melrose– escreve ele – existindo além do século XVII, os aventais foram também confeccionados com linho, e esta regra foi lei na Mary’sChapell nº1, de Edimburgo, a mais velha Loja do mundo; ao passo que o Ir∴ James Smith escreve, em sua história da velha Loja de Dumfries que ‘ao examinar a arca da Loja 53, nela existia apenas um avental de cabrito ou de couro, sendo os restantes confeccionados em linho’. Como tais Lojas eram as mais antigas que quaisquer outras da Inglaterra, é de se presumir ser um caso bastante claro provando a substituição por linho, do que , outrora, foi de couro”.

Não se pode dizer, entretanto, que o Ir∴ Crowe tenha inteiramente provado a sua alegação, visto que outras autoridades debatem ainda a questão, afirmando que os construtores – que necessariamente manuseiam ásperas pedras e pesadas madeiras de construção – precisavam de um tecido bem mais resistente que o linho ou o algodão. De qualquer maneira, nestes dois séculos, a Fraternidade usou Aventais de couro, embora muitas vezes, para os fins ordinários da Loja, fossem substituídos por tecido de algodão. E não passa de um contrassenso – que foram buscar bem longe – ver-se na pele de cordeiro uma alusão ao sacrifício do qual o cordeiro, por tanto tempo, tem sido um emblema.

Mas que significado terá para nós a palavra sacrifício? Se tivéssemos de responder completamente a esta pergunta teríamos de penetrar bem longe nos campos da ética e da teologia. Entretanto, tendo em vista o objetivo que nos anima, neste momento, podemos dizer que o sacrifício do Maçom é a alegre renúncia a tudo o que nele possa haver de antimaçônico. Se for, por exemplo, demasiadamente altivo para reunir-se com os outros sobre o Nível, teria oportunidade de deixar de lado o seu orgulho; se ele for demasiadamente humilde para agir sobre o Esquadro, ele poderia sobrepujar a humanidade; e se tivesse hábitos de corrupção, poderia abandoná-los, senão o uso do Avental não passaria de fraude e de trapaça.

Com tão carregamento de simbolismo, o Avental pode ser justamente considerado como o “mais antigo que o Velocino de Ouro ou a Águia romana, e mais honroso do que a Estrela ou a Jarreteira”, por não serem estas insígnias mais do que invenções da lisonja e distintivos de nomes completamente ocos.

O Velocino de Ouro foi uma ordem de Cavalaria fundada por Filipe, Duque de Borgonha, em 1429 ou 1430. Como insígnia era usado um Carneiro de Ouro com uma divisa inserida na joia, que dizia: “Opulência, não trabalho servil!” Os romanos de antigamente usavam uma Águia em suas bandeiras para simbolizar magnanimidade, fortaleza, “ligeireza” e coragem. A Ordem da Estrela teve origem na França, em 1350, tendo sido fundada por João II, a fim de imitar a Ordem da Jarreteira; desta última Ordem é difícil falar, visto ser a sua origem revestida de muita obscuridade e os historiadores diferirem entre si; foi, porém, tão essencialmente aristocrática quanto qualquer das outras.

Estes emblemas foram, em todo caso, um indício de aristocrática frivolidade e de separação, precisamente o oposto do que simboliza o Avental; e a superioridade deste último emblema sobre os primeiros é demasiadamente óbvia para merecer comentários.

Autor: H. L. Haywood

Nota do Blog

Esta tradução foi extraída do livro Estudos Maçônicos sobre Simbolismo, de Nicola Aslan. O texto original em inglês é um dos capítulos da obra Blue Lodge Masonry, de autoria de Haywood.

Fonte: O Ponto Dentro do Círculo

 

Fonte: http://omalhete.blogspot.com.br

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